Álbum Inverno no Cariri 2020 – Faixa 03


Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=JcNaksFoXgU

 

Na calçada

 

Na calçada da casa em que nasci

Era um pedaço do público espaço

Que me pertencia como se privado fosse

Sentado no batente as pernas estirava

E as recolhia quando alguém passava.

 

Sorrisos de contentamento se espelhavam

E assim a calçada era como tela de celular

Falava com o distante como se próximo fosse

Sorria para o estranho como amigo meu

 

Na calçada também se paquerava

Troca de olhares que tocava a alma

Acariciava, afetava e muito prometia

Nada definido e por isso mesmo encantava

 

Nas calçadas de outras casas por onde andava

Vi a bela amada, sorri, ela sorriu, me encantei

Olhei para trás, o olhar dela encontrei

Uma emoção tamanha que palavra faltava.

 

Na calçada eu a encontrei

Na calçada me apaixonei

Na calçada não mais me achei.

 

Na calçada perdido, sorrindo como bobo

Na calçada iludido, agradecido como tolo

Por um instante fui feliz, fui feliz.

 

Composição -  Hiran de Melo & Boy

Intérprete: 🎤 Boy

Arranjos e Gravação: Studio Washington Boy

Faixa 03 do Álbum Inverno no Cariri

Publicado no blog: Álbuns – Letras de Músicas

Vídeos:

https://www.youtube.com/watch?v=-uqD6G2cmME

https://www.youtube.com/watch?v=JcNaksFoXgU

 

Anexo

 

Depoimento do poeta: Na calçada

 

"Na calçada" é uma viagem ao passado, uma reflexão sobre a simplicidade das coisas cotidianas e como essas experiências, aparentemente pequenas, podem se carregar de significados profundos. A calçada, no poema, não é só um espaço físico; ela representa o lugar de transição, de encontros, de vivências. É o limiar entre o privado e o público, entre o íntimo e o coletivo. Nas calçadas, muitas vezes, a vida acontece, mesmo que de forma silenciosa, muitas vezes até imperceptível, mas com uma força que nos marca.

 

Quando falo da calçada da casa em que nasci, estou falando de um pedaço do mundo que era meu, um lugar onde eu me sentia dono, ainda que fosse apenas um pedacinho de rua. Essa sensação de pertencimento ao espaço é uma metáfora para o conforto e a segurança que encontramos nas pequenas coisas, nas nossas raízes, naquilo que parece simples, mas que tem um valor imenso.

 

A calçada se torna uma espécie de "tela de celular", e isso tem muito a ver com a maneira como, hoje em dia, nos conectamos de forma instantânea, mas sem realmente estarmos próximos. Trazemos esse contraste: como a calçada, aquele espaço tão concreto, se mistura com a ideia da comunicação moderna, onde um simples olhar ou gesto pode ser tanto uma forma de aproximação quanto de distanciamento.

 

Falávamos com o distante como se fosse próximo e sorria para o estranho como se fosse amigo. É a construção de um mundo social através de gestos mínimos, mas que nos conectam de maneiras intensas e significativas.

 

O momento de paquera na calçada é algo quase atemporal. O simples trocar de olhares, aquela troca silenciosa de intenções, é carregada de promessas, de algo que pode ser e ao mesmo tempo nunca será. E isso é encantador, porque há algo de mágico no "não definido", no "não concretizado". O encanto está justamente no mistério e na possibilidade.

 

Quando falamos sobre encontrar a "bela amada" nas calçadas de outras casas, estamos falando da magia do encontro inesperado. Esse momento onde o olhar cruzado entre duas pessoas pode ser tudo ou nada, e por vezes é o suficiente para nos perdermos. A emoção toma conta de nós a ponto de as palavras não fazerem mais sentido. O poema descreve como esses momentos fugazes, mas cheios de intensidade, podem nos transformar.

 

No final, a calçada se torna o cenário de uma perda, mas também de uma felicidade simples e verdadeira. "Na calçada não mais me achei", reflete o sentimento de ter se perdido em algo maior que a razão, em um sentimento que não se pode controlar. E, ainda assim, há uma aceitação dessa perda, um sorriso bobo e uma sensação de agradecimento, como se, por aquele momento, ter sido iludido ou "tolo" fosse o suficiente para ser feliz.

 

"Na calçada" é, portanto, uma celebração da espontaneidade, do que é vivido sem grandes expectativas, mas que nos marca de forma profunda e, por vezes, transformadora. A calçada, nesse sentido, é o palco de uma vida simples, mas cheia de momentos que valem a pena ser vividos, mesmo que, no final, eles nos deixem um pouco perdidos, mas com o coração aquecido e agradecido pela experiência.

 

Poeta Hiran de Melo 

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